quarta-feira, 16 de novembro de 2011

28 anos sem Janete


A imagem mais remota que tenho de uma novela é de cenas de Tarcísio Meira, de cabelos encaracolados, e Míriam Pires, como uma mulher enlouquecida que vivia num quarto cheio de manequins com roupas espalhafatosas. Era 1974 e a novela em questão, O Semideus, de Janete Clair. Mas eu era muito criança e não lembro de absolutamente mais nada dessa trama. A novela seguinte foi Fogo Sobre Terra, também de Janete, e lembro vagamente de Regina Duarte, Dina Sfat e Jardel Filho. E me recordo como se fosse ontem da cena do último capítulo em que Neuza Amaral era tragada pelas águas porque se negava a deixar uma casa que ia ser inundada.

Lembro da reprise de Selva de Pedra, em 1975, em especial à ótima sequência do acidente com o fusca de Simone (Regina Duarte), numa cena de perseguição. Fiquei impressionado! De Pecado Capital, lembro apenas de Betty Faria no primeiro capítulo. Eu era criança na segunda metade dos anos 70 e meus pais seguiam à risca a indicação da Censura com o selo que anunciava: "esse programa é proibido para menores de 12 anos", ou coisa assim. Só nos anos 80 é que fui acompanhar de fato às novelas das oito.


Da época em que passou O Astro, não me recordo da novela, apenas de sua abertura. O mesmo para Pai Herói. No Dia dos Pais de 1979, eu e meus colegas de quarta série fomos obrigados a decorar a letra da música de abertura, de Fábio Jr., para uma apresentação. A primeira novela de Janete Clair que de fato acompanhei com alguma assiduidade foi Sétimo Sentido, em 1982. Gostava da bela abertura, bem como da vinheta de "estamos apresentando" ao som de "Chariots of Fire".

Janete faleceu em 16 de novembro de 1983, enquanto ia ao ar sua novela Eu Prometo, da qual eu não era assíduo, portanto lembro pouco. Mas me recordo bem da comoção generalizada que formou-se em torno de sua morte. Vim a saber mais tarde de detalhes, como  sobre o câncer com que ela lutava havia três anos. Eu Prometo foi lançada como a "a nova novela das 10", que traria de volta o horário consagrado nos anos 70. Na verdade, não foi bem assim. A Globo sabendo do frágil estado de saúde da autora, não queria confiar-lhe uma novela no horário de maior faturamento, o das oito da noite. Então preferiu arriscar em um horário em que o prejuízo fosse menor.


Janete deve ter ficado chateada. Era uma mulher que amava escrever novelas, que se envolvia de verdade com os personagens e tramas que criava. Mas nunca foi poupada pelos críticos, que a acusavam frequentemente de "fantasiosa" demais. Problemas com a Censura tornaram suas novelas O Semideus, Fogo Sobre Terra e Duas Vidas obras mutiladas e prejudicadas. A Globo, às vésperas de completar 10 anos de existência (em 1975), resolveu "rebaixar" Janete do horário das oito - que ela mesma havia ajudado a consagrar na Globo - para as sete horas, tido como "um horário menor". Janete não gostou. Foi escrever a novela Bravo às setemas com a proibição de Roque Santeiro, às oitoa autora foi chamada às pressas para escrever uma trama substituta. Foi quando Janete inovou seu estilo, colocando mais realismo às suas histórias, e acabou por realizar seu melhor trabalho, Pecado Capital, desta vez aclamado pela crítica e pelo povo.

Na década de 80, o estilo de Janete foi novamente posto em xeque. Coração Alado foi uma novela malhada pela crítica, que acusou a trama de claustrofóbica, onde Janete pesou a mão no dramalhão. Sétimo Sentido e Eu Prometo foram pelo mesmo caminho. O fato é que, apesar de todas as intempéries, das críticas e problemas com a censura do Regime Militar, Janete Clair sempre foi campeã de audiência. Novelas como Irmãos Coragem, Selva de Pedra, Pecado Capital, O Astro e Pai Herói são consideradas clássicos de nossa teledramaturgia, e que valeram à autora a alcunha de Maga das Oito, ou, melhor, Usineira de Sonhos.

Para saber mais sobre a vida desta grande novelista, sugiro o livro "Janete Clair, a Usineira de Sonhos" que o jornalista Artur Xexéo lançou em 1996 pela editora Relume Dumará.

Também a página da autora no site Teledramaturgia.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Os Beijos de Aquele Beijo 2

A partir de 14/11/2011 a abertura de Aquele Beijo passou a mostrar 
novos beijos famosos de novelas, a saber:

1. Eduardo Moscovis e Adriana Esteves (Petrucchio e Catarina) 
em O Cravo e a Rosa (2000/2001)

2. Jardel Filho e Sandra Bréa (Juarez Leão e Telma) 
em O Bem Amado (1973)

3. Camila Pitanga e Antônio Fagundes (Carol e Raul) 
em Insensato Coração (2011)

4. Cláudio Marzo e Norma Blum (Fernando Seixas e Aurélia Camargo) 
em Senhora (1975)

5. Nicette Bruno e Ary Fontoura (Juju e Romeu) 
em Sete Pecados (2007/2008)

6. Cauã Reymond e Bianca Bin (Jesuíno e Açucena) 
em Cordel Encantado (2011)

7. Giulia Gam e Edson Celulari (Aline e Jean-Pierre) 
em Que Rei Sou Eu? (1989)

8. Nicola Siri e Lavínia Vlasak (Padre Pedro e Estela) 
em Mulheres Apaixonadas (2003)

9. Ângelo Antônio e Letícia Sabatella (Beija-Flor e Thaís) 
em O Dono do Mundo (1991)

sábado, 5 de novembro de 2011

As re-reprises de Ivani Ribeiro

Ivani Ribeiro é a única novelista a emplacar re-reprises no Vale a Pena Ver de Novo da Globo. A Gata Comeu, novela de 1985, foi reprisada em 1989 e 2001. A Viagem, novela de 1994, foi reprisada em 1997 e em 2006. Mulheres de Areia é a atual atração do Vale a Pena Ver de Novo. A novela foi ao ar originalmente em 1993 e teve sua primeira reprise entre 1996 e 1997. Essas três novelas são os maiores sucessos de Ivani na Globo e são remakes de antigas tramas da autora na Tupi nos anos 70.
A Gata Comeu foi originalmente chamada de A Barba Azul e foi ao ar na emissora paulista entre 1974 e 1975. Eu não lembro da novela porque era muito pequeno, mas me recordo da época que ela passou. Lembro que Silvio Santos certa vez, em seu programa dominical na Tupi, recebeu Eva Wilma e Carlos Zara, que viviam os protagonistas, e pediu para que eles trocassem tapas na cara diante da plateia, tal qual seus personagens Jô Penteado e o Professor Fabio faziam na novela. Na Globo, A Gata Comeu é hoje considerada cult e tem uma verdadeira legião de fãs, saudosos do Clube do Curumim, dos tapas entre Jô e Fabio e todas as tramas românticas com forte apelo juvenil que a novela tinha.

A Viagem foi ao ar na Tupi entre 1975 e 1976. Eu era criança nessa época e tenho apenas duas lembranças da novela: de Ewerton de Castro na cadeia – alguma cena de seu personagem Alexandre quando é preso no início da novela -, e de alguma sequência no Umbral, quando a novela já está mais adiantada – depois do suicídio de Alexandre. Bem, as cenas no Umbral foram o suficiente para eu, então com 7 anos, não querer mais ver a novela! Na Globo, A Viagem foi um dos maiores ibopes do horário das sete na década de 90. A trama continuava romântica, mas mais madura se compararmos com A Gata Comeu. E de fundo, a doutrina kardecista, explorada em toda sua extensão. Apelo emocional e folhetinesco maior não poderia haver.
Mulheres de Areia da Tupi foi ao ar entre 1973 e 1974. Acho que meus pais não acompanhavam, porque eu mesmo tenho vagas lembranças de O Semideus, novela de Janete Clair concorrente no horário na Globo. Sei que Mulheres de Areia é considerada o maior sucesso da Tupi dos anos 70. E não é para menos: sua trama, pra lá de folhetinesca, é simplesmente irresistível. Na Globo, a novela transformou-se em um verdadeiro fenômeno no horário das seis. Lembro que foi a única vez que ouvi falar na possibilidade da Globo trocar o horário da novela para as sete horas, aproveitando todo o seu sucesso. E agora as gêmeas “idênticas mas de temperamentos opostos” – como dizia uma chamada de estreia – estão de volta, acompanhadas de Tonho da Lua e sua indefectível frase “Aaaaa Ruthinha é boa, aaaaa Raquel é má!

Dina Sfat


O capítulo de O Astro do dia 12/08/2011 rendeu uma bela homenagem à falecida atriz Dina Sfat, intérprete de Amanda na versão de 1978. A trama apresentou cenas românticas entre Dina e Francisco Cuoco na novela original, inseridas no capítulo como cenas de flashback em que Ferragus (Cuoco atualmente) relembra um amor do passado. Eu era pequeno quando a primeira versão de O Astro foi ar, mas lembro bem da época em que passou. Ficou marcada em minha memória sequências da abertura em que se via a figura de Francisco Cuoco entre imagens exotéricas.
Acho que meu primeiro contato consciente com Dina Sfat se deu mesmo no trabalho seguinte dela: a novela Os Gigantes, em 1979. Também não acompanhei esta obra, mas já assistia a alguns capítulos soltos. Dina também aparecia na abertura, linda, expressiva, com “aqueles olhos que enchiam a tela”. Reencontrei a atriz em outras obras nos anos 80, como a minissérie Rabo de Saia (1984) e as novelas Eu Prometo (1982) e Bebê a Bordo (1988), seu último trabalho, e uma reprise de Gabriela (1975) em 1989.
Dina era uma atriz marcante, carismática, com grande presença em cena. Daquelas que valorizam qualquer obra. Minha admiração pela atriz cresceu ainda mais quando comecei a pesquisar sobre ela, em suas participações em novelas que não vi, como Selva de Pedra (1972), Fogo Sobre Terra (1974) e Saramandaia (1976), e filmes, como Macunaíma (1969). Nos anos 80, li sua biografia – “Palmas para que te quero” -, que ela escreveu quando ainda era viva. Confesso que fiquei decepcionado com a revelação de que ela não gostava de atuar em televisão, fazia por amor ao teatro, para montar suas peças com seu salário na Globo. E eu que nunca tive a oportunidade de vê-la nos palcos! [humpf!].
Dina nos deixou cedo e faz uma falta enorme. Como mostrado na emocionante homenagem que a Globo a fez no especial TV Ano 50 (em 2000), Dina Sfat é “unforgettable”! Saudades.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Kitsch e Arrebatador


A novela O Astro, a mais nova aposta da Globo, virou a atual "menina dos olhos" da emissora. Afinal, em que resultará a experiência de adequar o público do horário ao clima folhetinesco da atração? A meu ver, existe algo de novo no reino de nossa teledramaturgia. Apesar do horário de exibição e sua curta duração (inicialmente programada para ter 60 capítulos), o programa não é série, minissérie ou "especial", como já foi chamado. É novela, no sentido exato da palavra. Aliás, um novelão assumido. E o que mais chama a atenção são o seu estilo e estética. 

Atualmente, em televisão, pode-se dizer que um programa não tem estilo, tem pressa. Pressa em fisgar a audiência do seu público alvo. E o trunfo de O Astro é fazer da pressa o seu estilo. Não a pressa em contar em 60 capítulos uma história originalmente apresentada em 186. Mas a pressa em manter o telespectador preso a uma história diária em um horário que é ingrato e díspar: vai ao ar lá pelas 23h às terças, quintas e sextas-feiras, e quase meia-noite às quartas. Difícil criar no telespectador alguma fidelidade com uma grade dessas. 

Mas este cenário não é muito diferente daquele da estreia da novela original. Para situar historicamente, voltemos a dezembro de 1977. A novela das oito anterior, Espelho Mágico, derrubara a audiência do horário nobre da Globo, enquanto a TV Tupi despertava cada vez mais a atenção do público para sua novela O Profeta, concorrente no horário. Para frear a crescente audiência que a trama de Ivani Ribeiro vinha tendo na Tupi, o diretor Daniel Filho foi enfático: "Não pode haver mais erro (...) temos que apelar (...) e procurei fazer uma coisa bem extravagante, bem `kitsch`". (Daniel Filho sobre O Astro em seu livro Antes que me Esqueçam, da Editora Guanabara, 1988). 

Foi assim que nasceu O Astro de Janete Clair, uma trama que tinha a obrigação de ser um novelão, com todos os clichês característicos do folhetim. E ninguém mais apropriado para a tarefa do que Janete. Não vou nem entrar no mérito de que a trama central de O Astro lembrava a de O Profeta. Afinal, Herculano e Daniel, os protagonistas das duas novelas, eram bem parecidos, cada um em sua área de atuação. O Astro começou cambaleante, mas a morte de Salomão Hayalla fez a novela acontecer e o sucesso veio. 

Voltando ao Astro atual, percebemos que o universo kitsch continua proposital. Aliada à sua história e à agilidade com que é contada, vemos uma estética pop com muitos efeitos de imagem, edição e trilha sonora que misturam baladas nostálgicas com música atual. Tudo isso funciona bem e serve para dar o clima que a atração propõe. A beleza do elenco ajuda. Os shows de Herculano Quintanilha (Rodrigo Lombardi) beiram o surrealismo. Algumas sequências criam uma atmosfera intimista e, por vezes, quase onírica. 

A identificação do público com os personagens e suas tramas é meio caminho andado para o sucesso. Os personagens de O Astro se entregam às suas paixões arrebatadoramente, e não é em vão. A Amanda de Carolina Ferraz fica perplexa quando tenta racionalizar sua paixão por Herculano. É como se ela nos perguntasse se Herculano é real ou fruto de sua imaginação. E nós, seus cúmplices, uma vez hipnotizados pelo astro, também não temos esta resposta. Também fomos fisgados e caímos nesta fantasia. 

Do outro lado, vemos uma Regina Duarte que há tempos não nos era apresentada. Clô Hayalla tem um quê de mulher infeliz, mas, ao mesmo tempo, uma energia que só Regina poderia emprestar à personagem. Suas crises de histeria e seus momentos de mulher indefesa frente a um jovem encantador (Felipe, de Henri Castelli) nos dão aquela sensação de que ela, Clô, é real e muito próxima de nós. 


Não é difícil para o público se identificar com criaturas com sentimentos inerentes a todos.  E a qualidade da produção, do texto, do elenco, da direção, só reforça essa credibilidade que uma obra precisa passar, por mais ficcional que seja, para criar este laço com seu público. O astro Herculano Quintanilha encanta a todos pela fantasia, pelo sonho. Este é o clima que a novela propõe antes de seu público ir para cama. Não por acaso, Carlos Drummond de Andrade apelidou Janete Clair, na época da novela original, de "usineira de sonhos".

Viva a nostalgia!


Nos anos 90, quando as tevês a cabo começaram a se popularizar no Brasil, apareceu uma programação importada destinada aos saudosistas. O canal Fox, por exemplo, reprisou seus seriados da década de 60 que fizeram a festa de quem hoje tem pelo menos 40 anos. O canal Boomerang era destinado à reapresentação de desenhos animados clássicos, principalmente os da Hanna-Barbera. 


Não demorou a surgir o seguinte questionamento: com todo o seu acervo de inesquecíveis produções dos anos 70 e 80, quando a Rede Globo iria criar um canal destinado exclusivamente ao seu público saudosista? Como existem canais apenas de filmes ou de desenhos, o anseio era por um destinado a reprises de novelas antigas - as "clássicas", como comumente se fala. 

Demorou, mas hoje se pode afirmar que esse sonho, se não foi concretizado em sua totalidade, pelo menos tem satisfeito muitos nostálgicos. O Canal Viva, pertencente à Globo, que em maio completou um ano de existência, veio atender a esse público que adora se divertir com o passado, em toda extensão que isso possa representar. 
  
Uma de suas primeiras estreias, a reprise da novela Vale Tudo, de 1988, em pouco tempo virou mania em redes sociais como o Twitter, causando um frisson generalizado. Independentemente do horário ingrato em que a trama foi apresentada (de segunda a sexta-feira à 0h45), o programa tinha fãs fixos que se divertiam com roupas, acessórios, elementos de cena, gírias e merchans da época da novela. 

Em pouco tempo, Vale Tudo tornou-se líder de audiência em seu horário na TV a cabo. A novela - um verdadeiro clássico de nossa teledramaturgia - tinha fãs de todas as idades: não apenas os saudosistas, mas também aqueles que a conheciam apenas de ouvir falar. O tema era atual e os personagens, pra lá de carismáticos. E a novela comprovou a tese de que o tempo passa, as tecnologias mudam e a sociedade pode até avançar, mas um clássico é para ser revisto, sempre. 

Nas tardes de domingo de maio deste ano (mês de aniversário do Viva), enquanto a TV aberta apresentava uma programação desgastada e desinteressante, os nostálgicos se divertiram com a reapresentação do Cassino do Chacrinha. De uma época em que a televisão era menos careta, o Velho Guerreiro mostrava porque vinha para confundir, e não para explicar. 


Anárquico, nonsense, debochado e popular, nada no programa passava despercebido aos olhos do telespectador. A figura do Velho Guerreiro, as chacretes, as atrações musicais, o comportamento dos jurados, a plateia, os "prêmios" que Chacrinha jogava para o auditório (bacalhau, mandioca, feijão, farinha), tudo fazia o público de casa vibrar. Não era para menos que Chacrinha ou suas atrações sempre acabavam ficando entre os assuntos mais comentados do Twitter. 

De sua estreia para cá, o Viva tem presenteado seu público com boas atrações que enchem os olhos dos nostálgicos. As minisséries Anos Dourados e Anos Rebeldes. As novelas VampRoque Santeiro e as duas próximas estreias do canal, Barriga de Aluguel e Top Model. O musical Chico e Caetano e os humorísticos Viva o Gordo, TV Pirata e Armação Ilimitada.

E que venha Os TrapalhõesGlobo de OuroTieta, Dancin´DaysQue Rei Sou Eu?O Tempo e o VentoRabo de SaiaBalança Mas Não Cai, O Planeta dos HomensTV MulherSítio do Picapau AmareloBalão MágicoPirlimpimpimPlunct-Plact-Zum, etc...

E você, quais programas anteriores aos anos 90 gostaria de ver reprisado no Canal Viva?

domingo, 30 de outubro de 2011

O voo do Astro


A tentativa da Globo de experimentar um novo horário de novelas - em torno das 23 horas, então ocupado por minisséries e seriados - ao que parece, foi além das expectativas da emissora, já que sua meta de audiência foi superada. Isso vem comprovar que existe público para o formato nesta faixa. 

Nos anos 70, a novela das 8 estava para o que hoje é a novela das 9. E e a novela das 10 naquela época era o que é a novela das 11 para a atualidade. O antigo horário das 10 era ocupado pelo que convencionou-se chamar de "experimentos em teledramaturgia". Ou seja, o horário permitia à emissora correr o risco da ousadia em temas e formatos. E também era o horário menos visado pela censura do Regime Militar. Foi às 10 da noite que grandes dramaturgos se destacaram na televisão: Dias Gomes (Bandeira Dois, O Bem Amado, O Espigão, Saramandaia), Bráulio Pedroso (O Cafona, O Bofe, O Rebu), Jorge Andrade (Os Ossos do Barão, O Grito), Wálter George Durst (Gabriela, Nina).

O Astro provou que pode-se aproveitar a faixa para o mesmo fim. Não faltou violência, cenas de sexo e situações politicamente incorretas, com cenas de personagens fumando, bebendo e jogando. E o público comemorou já que, na realidade, sentia falta desta liberdade na nossa teledramaturgia. De uns vinte anos para cá, a TV brasileira sofreu um processo de "encaretamento", com uma onda politicamente correta que, bem ou mal, vem limitando os autores de novelas em seus processos de criação. Em um horário com uma classificação indicativa mais permissiva, pode-se voltar a abordar temas e situações há muito tempo banidos de nossas novelas.

Mas, acima de tudo, O Astro mostrou um bom e velho folhetim. O remake de um antigo sucesso de Janete Clair foi a escolha ideal para se celebrar os 60 anos da telenovela no Brasil - data comemorada em dezembro (a primeira novela, Sua Vida Me Pertence, estreou em dezembro de 1951, na TV Tupi de São Paulo). O estilo "kitsch", exagerado, melodramático, em texto, interpretações e caracterizações, mostrou ter sido uma opção acertada. 

O tom popularesco da trama (que muitas vezes beirou o estilo mexicano de teledramaturgia), com referências à cultura pop e erudita, foi a tônica do texto afiado dos roteiristas de O Astro - Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro, e seus colaboradores Tarcísio Lara Puiati e Vitor de Oliveira. A direção geral de Mauro Mendonça Filho soube muito bem incorporar o texto à proposta da novela. 

E uma ótima direção se faz com um ótimo elenco em um texto de primeira. Pudemos acompanhar grandes momentos de Marco Ricca (Samir), Humberto Martins (Neco) Rosamaria Murtinho (Magda), Fernanda Rodrigues (Jôse), Antônio Calloni (Natal), e tantos outros. E em especial Regina Duarte - com sua Clô Hayalla -, que há muito tempo não tinha em novelas uma interpretação tão marcante. Vale destacar também a atuação de Frank Menezes e Pablo Sanábio (como a dupla de cabeleireiros Clayton e Pablo), responsáveis pelos momentos mais hilários da novela.

Mas claro, nem tudo foram flores em O Astro. Adaptar uma obra de 186 capítulos para menos da metade não é uma tarefa fácil. Para além da realização dos ajustes necessários (como suprimir ou condensar tramas e personagens), a opção pela agilidade mostrou-se acertada de um lado - prende o telespectador - mas também, por vezes, comprometeu o entendimento da trama - chegou a confundir o público.

A notícia de que a Globo vai fazer uma nova adaptação de Gabriela Cravo e Canela, de Jorge Amado,  em 2012, é a comprovação de que a emissora acertou em sua experiência e pretende levar adiante o horário das 11. O voo de Herculano Quintanilha (ao fim do penúltimo capítulo de O Astro) serve aqui como uma metáfora para as novas investidas da emissora neste formato de novelas, mais curtas, em um horário que permite ousadias e textos mais sofisticados e elaborados. O público aprovou. É realmente para se comemorar.