segunda-feira, 3 de outubro de 2011

A novela das fêmeas alfa e chorosas


A Globo tem em boa conta as donas de casa telespectadoras das 18 horas, público alvo da faixa. A Vida da Gente é uma novela feita especialmente para elas: é, acima de tudo, uma obra feminina. "Novela de mulherzinha" como tuitei outro dia, brincando.

Os dramas da novela são femininos, pertinentes a esse universo. As mulheres dominam toda a trama e não por acaso, a protagonista Ana (Fernanda Vasconcellos) sofre e chora muito no intuito de sensibilizar os telespectadores, fisgar pela emoção. A identificação do público com os dramas dos personagens tem que ser direta - reza a cartilha de toda novela.

Jayme Monjardim, o diretor, navega à vontade neste universo melodramático. As minisséries Maysa, Chiquinha Gonzaga, A Casa das Sete Mulheres, as novelas A Idade da LobaPáginas da Vida e Viver a Vida são alguns trabalhos do diretor onde a figura feminina impera.

Autores como Manoel Carlos e Gilberto Braga sempre assumiram sua predileção por protagonistas mulheres em detrimento à figura masculina. Suas tramas são comumente tachadas de "novelas femininas". Diferente de novelistas como Lauro César Muniz, Marcílio Moraes ou Benedito Ruy Barbosa, onde há um apelo masculino dominante. 

Em A Vida da Gente, Lícia Manzo escreve para mulheres dramas típicos do universo feminino. Os personagens masculinos ficam em segundo plano e são pobres, fracos ou inferiores se comparados às mulheres da novela. Ou, na melhor das hipóteses, não passam de homens vistos através do olhar feminino. Os da autora, claro! 

Os homens que apareceram até agora só serviram de escada para o drama central, a história de Ana, a heroína, e sua relação com a mãe megera Eva (Ana Beatriz Nogueira) e a irmã Manuela (Marjorie Estiano), outra mocinha chorosa. Como Rodrigo (Rafael Cardoso) - rapaz inseguro, um fraco se comparado à força das três mulheres - mas que é nada menos que o "mocinho" da trama. 

Outros personagens masculinos também ficam devendo. Jonas (Paulo Betti) é um cinquentão que trocou Eva por uma mulher bem mais jovem e bonita e é ridicularizado pela filha debochada (Maria Eduarda). Ou seja, é um homem patético. O personagem de Stênio Garcia - Seu Laudelino - é uma representação masculina curiosa dentro da novela: um homem de certa idade que insiste em casar com a namorada, uma senhora que só quer, só pensa em namorar. E ainda tem um defeito grave: é sovina!

Há ainda o personagem de Ângelo Antônio que só faz reforçar essa ideia: Marcos é o marido dominado pela mulher durona e provedora da casa. Enquanto ela trabalha, ele cuida das filhas e dos afazeres domésticos, e ainda é vítima dos olhares, comentários e assédio de outras mulheres. Laudelino e Marcos representam uma inversão de papeis dentro de um mundo masculino e opressor aos olhos das mulheres. Em A Vida da Gente, as mulheres dominam e mandam em seus homens. Seriam elas "fêmeas alfa"?!

Tudo isto, recheado a um melodrama pesado. Mas que cativa, seja pela força da história, pela beleza das imagens bem acabadas, ou pela boa interpretação do elenco. A embalagem é bonita, moderna e agradável de se ver. Mas o conteúdo remete às radionovelas dos anos 50: melodramas despudorados feitos para o consumo feminino. Mas num contexto bem contemporâneo.

7 comentários:

  1. Você descreveu uma reação que eu senti na novela ao acompanhar alguns capítulos, mas que não tinha parado para pensar. Os homens são realmente segundo plano. O ambiente, o clima e as imagens da novela em muito lembram Páginas da Vida, e isso ficou evidente desde o começo, principalmente com a mesma atriz numa mesma abordagem, contudo, diferente da obra de Maneco, o personagem de Thiago Rodrigues era vivo, estava presente com Fernanda, e nós éramos capazes de sentir o amor dos dois em meio aos abalos. Aqui, além da inércia do personagem de Rafael Cardoso, a química do casal está mais para Pedro e Marina. O romance dos dois não convenceu. Mas é uma trama agradável, concordo com você. E os diálogos bem elaborados têm sido o grande trunfo para me deixar alguns minutos diante da tevê.

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  2. Legal a análise, acho que esse ponto das mulheres dominarem é o que mais se assemelha ao estilo do Maneco. Mais do que a forma como são conduzidos os diálogos e situações. Tenho gostado da trama, sobretudo porque é bem focada na história central.

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  3. A direção de Jayme Monjardim é sensível e está valorizando muitíssimo o texto da novela.

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  4. Perfeito, querido! Análise mais que apurada! Nada mais tenho a declarar, a não ser que novela é uma delícia.

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  5. Eu estou encantado com a novela!
    Saudosismo dos bons tempos de Maneco? Comparações permitidas. Mas a autora tem sua marca registrada e isso a diferencia!

    Antes eu me perguntava: Será que vem um Maneco ágil? E veio. Estou adorando.

    Vc poderia citar que Aguinaldo Silva tb cria personagens femininas muito fortes tb. Exemplos dele não faltam, como a atual, Senhora do Destino, Tieta....


    Excelente texto, como todos que são elaborados por aqui. Vc é o pai de todos nós blogueiros! ahhahaqhah
    Brincadeira!
    Abraço

    Fábio Dias
    www.ocabidefala.com

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  6. Confesso que a novela me surpreendeu positivamente. Apesar de dramalhão, é muito bem conduzido pela autora e, apesar das semelhanças com o universo de Manoel Carlos, Lícia Manzo consegue dar mais agilidade às tramas. A análise das diferenças entre personagens masculinos e femininos foi perfeita. Espero que os homens se tornem mais interessantes na trama e não sirvam apenas de escada. Isso enriqueceria ainda mais a novela.

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  7. Lembra muito as Soap Opera americanas todo o conteúdo da novela

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